sexta-feira, 18 de novembro de 2011

"MINHA PONTE, MINHA VIDA": Pontes de São Luís servem de teto para famílias


"É a verdade o que assombra, o descaso o que condena...". Estes versos da canção retratam bem uma triste realidade que atinge muitas famílias e que está, literalmente, bem debaixo de nossos pés: a falta de moradia digna.

Duas das principais pontes de São Luís, cujos nomes de batismos prestam "reverência" a membros da elite letrada maranhense, servem de abrigo para centenas de pessoas que tentam sobreviver à margem da ineficiência de políticas públicas e dos olhares que jogam para "debaixo da ponte" aquilo o que ninguém quer ver. Confira a matéria abaixo, publicada no Jornal Pequeno do dia 13 de novembro de 2011:

Endereço: Embaixo da Ponte

Os governantes se sucedem, dezenas de programas sociais são implantados, mas uma triste realidade não muda na capital maranhense: o cenário de miséria extrema representado por dezenas de famílias que fazem das duas principais pontes de São Luís seu teto.

Ao menos 70 famílias (cerca de 300 pessoas) moram embaixo das pontes José Sarney (São Francisco) e Bandeira Tribuzi (Jaracati), em barracos improvisados construídos com lonas, papelão, pedaços de compensado, lata. Muitos desses barracos precários são sustentados por palafitas, para que a maré não os invada.

São homens, mulheres, jovens, adultos, idosos e muitas crianças, vivendo num ambiente insalubre e disputando espaço com ratos e urubus, entre outros animais, que são atraídos pelo lixo e pela sujeira que se espalham por todos os lados.

A reportagem do Jornal Pequeno conheceu de perto um pouco do drama dessas pessoas – seres abandonados pelo poder público, e invisíveis, muitas vezes, a quem trafega sobre as 'pontes dos miseráveis', batizadas com os nomes de dois maranhenses célebres.

José Sarney – Na Avenida Ferreira Gullar, no São Francisco, aproximadamente 30 famílias moram sob a ponte José Sarney, numa área que começou a ser ocupada há mais de duas décadas.

A comunidade é composta por 14 homens, 12 mulheres, dois idosos e 38 crianças. Ninguém ali tem renda média mensal maior do que um salário mínimo (R$ 545). Trabalho fixo também é raridade para quem mora embaixo da ponte – o sustento das famílias vem de 'bicos', os homens trabalhando como pedreiros, carroceiros, na pesca ou catando caranguejo, e as mulheres às vezes como diaristas (mas a maioria cuida dos filhos e dos afazeres domésticos).

A piauiense Maria Antonia da Silva, mãe de oito filhos, tem 21 anos e mora no local desde os 5. Ela disse que os filhos em idade escolar estão matriculados em escolas da rede pública. Ela explicou que a falta de oportunidades no Piauí fez seus pais virem para o Maranhão, mas ela nunca pôde estudar e se qualificar para melhorar de vida.

'Meu marido tem uma oficina improvisada aqui no barraco para consertar ventilador. Juntando o que ele ganha, de vez em quando, aos três benefícios do Bolsa Família que recebemos, no final do mês conseguimos juntar R$ 220. Aqui falta tudo. Não temos banheiros, nem água encanada. Fazemos nossas necessidades fisiológicas dentro de latas, depois colocamos em sacolas plásticas e jogamos na maré. A comida é feita no carvão e não temos água filtrada nem gelada. Aqui também não há coleta de lixo', contou Maria Antonia.

O pedreiro Elias Jorge Gama de Souza, 34, pai de três filhos, vive embaixo da ponte há mais de 20 anos. Ele relatou ao JP que o aparecimento de doenças é muito comum no local. 'Convivemos dia e noite com muita muriçoca, ratos, baratas e outros bichos', afirmou. A poeira, segundo Elias, é outro flagelo, pois favorece o aparecimento de doenças respiratórias, afetando diretamente crianças e idosos.


A fome é outra angústia diária. 'Nem sempre temos o que comer. Hoje faltou o café e tomamos suco artificial com pão. Também não temos, ainda, nada para almoçar. Mais tarde vou até a feira ver se consigo uma ossada para cozinhar. Sou separado e fiquei com os meus três filhos, porém não tenho emprego fixo e preciso sustentá-los. Quando não tenho dinheiro, peço comida. É melhor pedir do que roubar', declarou o pedreiro.

A aposentada Maud Silva, 70, mora sob a ponte há 18 anos, com o filho e três netos. Disse que recebe um salário mínimo por mês, porém gasta R$ 380 com remédios para hipertensão, artrite, artrose e osteoporose. O restante só dá para pagar o débito mensal feito no comércio vizinho.

'Hoje vou almoçar um pedaço de mamão, porque não tenho o que comer. Apesar da idade, ainda lavo roupa para os outros para ganhar um dinheirinho extra. Já fomos cadastrados pela Defesa Civil, pelo governo do estado e pela Prefeitura para recebermos assistência social e moradia. Mas a única coisa que nos deram foi um aluguel social de R$ 150, que mal dá para comprar comida. Nos disseram que até o final do ano seremos levados para abrigos no Reviver [Praia Grande], mas eu não vou deixar minha casa para ir a lugar nenhum', afirmou Maud.

Bandeira Tribuzi – No Jaracati, a situação é semelhante. Aproximadamente 40 famílias residem sob a Ponte Bandeira Tribuzi e também vivem em condições insalubres.


O morador mais antigo do local, Francisco Mendes de Souza, 65 anos, natural do Piauí, disse que mora na área há 22 anos e lá criou os 10 filhos. 'Hoje tenho 50 netos e todos vivem aqui. Vim para o Maranhão em busca de uma vida melhor, e apesar das dificuldades não me considero uma pessoa infeliz. Aqui já foi pior, pois convivíamos com muito lixo e bichos. Tivemos uma melhora porque moro na parte alta, mas muitas famílias ainda vivem nas palafitas. Já fui catador de lixo, de latas e fiz de tudo um pouco. Agora, abri um pequeno comércio e daqui vou tirando meu sustentando e o da minha família', disse Francisco.

A dona de casa Francisca Lúcia Carneiro de Souza, 31, contou que é mãe de cinco filhos e que a maior dificuldade dos moradores é a falta de assistência e atenção social por parte do poder público. Ela disse que as famílias locais vivem precariamente: ainda cozinham no carvão, instalam 'gambiarras' para obter energia elétrica, e têm de jogar fezes e urina na maré, que passa embaixo das casas.

O catador de latas Carlos Magno Sena Mendes, 42, afirmou que a ponte Bandeira Tribuzi já é seu teto há 22 anos. Sob a ponte, ele cria sozinho seus seis filhos. O trabalho de Carlos Magno é árduo e nem sempre recompensador. Para ganhar R$ 2, o catador precisa juntar um quilo de latinhas (60 unidades). A dificuldade aumentou, recentemente, pois ele sofreu um corte na perna e tem de ficar em casa, se recuperando. Momentaneamente, tem de depender da ajuda de amigos e parentes para se manter e alimentar os filhos.

O que diz o poder público – Depois de três solicitações do JP, via e-mail, para que a Secretaria Municipal da Criança e Assistência Social (Semcas) informasse se há projetos sociais direcionados às famílias que moram sob as pontes Jose Sarney e Bandeira Tribuzi, a secretaria finalmente respondeu, na sexta-feira (11), com uma brevíssima nota:

'As famílias estão cadastradas e acompanhadas pelo Centro de Referência de Assistência Social (Cras). Algumas saíram e estão em aluguel social. As que desejam sair podem ser incluídas em aluguel social. O objetivo é que todas sejam incluídas em programas de habitação e em outros programas sociais.'

Hugo Freitas
Com informações do Jornal Pequeno

3 comentários:

  1. Bom dia Hugo Freitas, São responsáveis por essa miséria mostrada nessa matéria em comento. Muito mais, os eleitores, doque os eleitos. Já faz alguns anos em que colocamos a culpa nos governantes e, esquecemos de mostra o resultado maléfico aos verdadeiros resposáveis.Com denúncias! Então qual seria a forma correta? Mostra-se os resultados da corrupção para os eleitores e eles não dão ouvidos. Esquecem de seus sofrimentos, na vespera da eleição, ao receberem uma cédula, cimento ,tijolo, roda de arame, carro de mão e tantas outras coisas. A cada dia que passa mais corrupção e mais sofrimento. Fossemos um povo civilizado não votariamos em um governo ou em um candidato que não lava a cara e nem o anus. A cara é o centro da cidade as repartições públicas a infraestrutura. O anus é a periferia e as moradias debaixo das pontes etc.. Quem não faz para si não faz para os outros. Quem não limpa a porta de sua casa, não pode cuidar bém de uma cidade. São as nossas atitudes responsáveis pelo bém ou pelo mal! Obrigaddo pelo seu espaço. Abraços. Reinaldo Cantanhêde Lima

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  2. Olá, meu companheiro! nós só vamos tê um Estado, município melhor, qando todos os cidadãos maranhense, tiver total conhecimento do valor que seu voto tem. Por tanto, temos que politiza-los, com certeza já ouviram um texto que fala do analfabeto, pois a oligarquia que predomina nosso estado, fazem dele uma fábrica de analfabetos, se o povo não faz políca? a quem faz, só que para o benefício próprio...

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  3. Creio que o problema da miséria nesse estado economicamente rico (12ª economia do país) reside na ineficácia de políticas públicas aliada a uma desigual e abissal distribuição de renda, concentrada nas mãos de menos de 20% de uma elite econômica e politicamente dominante.

    Grato pela participação dos senhores. Abraços fraternos.

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Grato pela participação.