Está nas mãos dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) definir se as concessões de emissoras de rádio e televisão nas mãos de deputados e senadores devem ou não ser cassadas.
Ação apresentada em dezembro pelo PSOL com base em estudos e argumentos elencados pelo Coletivo Intervozes, que luta pela democratização da comunicação, cobra o cumprimento do artigo 54 da Constituição.
O texto constitucional veta a parlamentares “firmar ou manter contrato” como sócios de concessionárias de serviço público, o que é o caso dessas concessões. No Brasil, as frequências pelas quais são veiculadas as emissões de rádio e de TV são de posse do poder público, que as concede mediante o cumprimento de determinadas regras.
A medida prevista pela Constituição de 1988, porém, é historicamente descumprida, havendo casos notórios de parlamentares que são donos de concessões, como o de José Sarney, presidente do Senado (PMDB-AP), que, embora não conste oficialmente como proprietário, tem os filhos nesta condição. Levantamento feito pelos autores da ação detectou 41 deputados e 7 senadores como sócios ou associados de canais rádio e TV.
A organização Transparência Brasil encontrou número ainda maior ao levar em conta casos de parentes registrados pelo Ministério das Comunicações: 52 deputados e 18 senadores, ou seja, respectivamente 10% e 22% da composição total das casas legislativas, uma situação reconhecida pelo atual ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, como ilegal.
“Isso cria um interesse político direto na concessão, que representa um poder muito grande na democracia brasileira”, diz João Brant, da coordenação executiva do Intervozes. Embora a outorga de concessões seja atribuição do Poder Executivo, suas renovações são feitas pelo Legislativo, ou seja, cria-se a possibilidade de que um político defina sobre sua própria empresa valendo-se de um cargo público e eletivo.
O próprio processo de concessão foi utilizado muitas vezes como moeda de troca nas relações entre governo federal e base aliada no Congresso. “Se a mídia exerce um poder, ela não pode ter relação com os outros três (Executivo, Legislativo e Judiciário) sob pena de perpetuar determinadas posições políticas. Essa questão inclusive se relaciona às eleições livres. Há candidatos com condições de autopromoção em determinadas emissoras.”
Além disso, a ação alerta que a barreira política imposta por um deputado ou senador no conteúdo divulgado pela empresa de comunicação limita a liberdade de expressão da população. “Ainda que a recepção das informações pelos espectadores possa passar por mediações distintas, é indiscutível que quem controla um canal de radiodifusão (o polo ativo da comunicação) exerce forte e nítido poder de influenciar a opinião pública”, diz a arguição de descumprimento de preceito fundamental, que tem como relator o ministro Gilmar Mendes.
O texto pede, em caráter liminar, que o governo federal seja impedido de outorgar ou renovar novas concessões dadas a parlamentares. Se deferida na íntegra, a decisão impede também que políticos com sociedade em concessões tomem posse nos cargos.
O Congresso descumpre atualmente outro artigo constitucional que não precisa de regulação para ser colocado em prática. O Conselho de Comunicação Social deveria estar constituído e funcionando, mas tem um histórico de operação esporádica e de pouco efeito. O órgão serviria para debater as questões relevantes do setor e propor medidas que poderiam, quando fosse o caso, ser transformadas em projeto de lei. Em novembro de 2010, sob pressão, o presidente do Senado, José Sarney, chegou a se comprometer com a reativação do colegiado, mas não levou a promessa adiante.
Além disso, caso permaneça a atual situação, há risco de que o debate sobre regulação da comunicação seja mais um permeado pela atuação parlamentar em interesse próprio, a exemplo das mudanças no Código Florestal. Grupos que debatem a democratização do setor querem a discussão de regras para garantir o cumprimento de outros artigos previstos pela Constituição, como o veto a oligopólios e o estímulo à produção regional.
Os regimentos internos da Câmara e do Senado sugerem que o político com envolvimento direto em um tema se declare impedido de votar em matérias a respeito, mas o dispositivo não é comumente evocado pelos parlamentares.
Fonte: Rede Brasil Atual
Editado por: Hugo Freitas
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