segunda-feira, 4 de abril de 2016

A história de vices que chegaram ao poder

Café Filho, João Goulart, José Sarney, Itamar Franco e agora uma nova possibilidade com Michel Temer


João Carvalho Jr., Especial para O Imparcial
Por trás do pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT) está uma briga por poder. Michel Temer (PMDB), o vice, diz que os seus espaços foram reduzidos com o passar do tempo e que ele tem sido um vice ‘decorativo’. Temer é um dos grandes articuladores e mobilizadores para que Dilma caia. Isso, consequentemente, levaria ele ao poder máximo da nação, o que para os aliados do governo petista seria um golpe.
Michel Temer é apenas um exemplo de tantos vices que se tornaram pedra no sapato do titular do cargo. A história mostra que outros casos nacionais de sucessão se concretizaram. E até trocas regionais mais recentes e com muito mais características de novela mexicana.
Nos municípios do MA
Nos preparativos para as eleições, antes mesmo das convenções partidárias, é preciso fechar boas parcerias, ter coligações firmes e pessoas de confiança na chapa. Nas disputas majoritárias, isso passa pela escolha do vice.
O problema é quando os vencedores na corrida eleitoral começam a divergir nas posições e, de repente, a parceria e as mãos dadas nos comícios e na posse, se desatam e só faltam a apontar dedo em riste um ao outro.
Pode não ter chegado a tal ponto ainda, mas no Maranhão prefeitos e vices têm demonstrado total desalinho em certas cidades. O Imparcial elencou alguns casos que chamaram atenção.
bla bla bla
Santa Inês
O caso mais emblemático dos últimos tempos tem acontecido na cidade de Santa Inês, desde quando o prefeito Ribamar Alves (PSB) se envolveu em um suposto caso de estupro. Ele foi preso, ficou na Penitenciária de Pedrinhas por quase um mês e, mesmo assim, a prefeitura esteve sem seu gestor principal por quase todo o tempo em que ele ficou afastado. Foi preciso o vice, Ednaldo Lima Alves, o Dino (PT), entrar na justiça para assumir o poder. O juiz da comarca local concedeu o direito a Dino, mas, assim que saiu da prisão, Ribamar Alves conseguiu reaver o posto. Esse foi apenas um episódio da relação conturbada entre os dois.
“Ele estava no direito dele. Enquanto vice, assumiu na eventualidade da falta do titular. Assumiu, é uma boa pessoa, tem um bom caráter, uma pessoa de bem”, disse Ribamar à época da soltura.
Apesar de manterem palavras cordiais nas referências que cada um faz ao outro, Ribamar e Dino estão distantes praticamente toda a gestão. O motivo seria a falta de espaço para o vice atuar. O resultado é que os dois são propensos adversários no pleito de outubro próximo.
Bom Jardim
A cidade pouco conhecida pelos maranhenses ganhou repercussão nacional por causa da sua antiga gestora, Lidiane Leite. Ela foi a principal personagem de um caso policial envolvendo desvios de verbas públicas da educação na cidade interiorana.
Foragida, Lidiane abriu espaço para sua vice, Malrinete Gralhada (PMDB), assumir o poder. A sensação da nova prefeita poderia ser de constrangimento pelo fato ocorrido com a titular do cargo, mas as duas já não dialogavam tão bem.
A defesa de Lidiane tentou impedir a posse de Gralhada, justificando que a decisão era uma “verdadeira e grave ingerência do Poder Judiciário sobre as esferas de atuação do Poder Executivo Municipal, interferindo na ordem administrativa geral”. Mas não adiantou.
Timbiras
Localizada na região dos cocais do estado, Timbiras também tem convivido com os desacordos entre o prefeito Carlos Fabrizio Sousa Araújo e o vice Jose Luiz de Paula Rodrigues Junior. No meio da disputa entre os dois, estariam vereadores apoiando o vice para que ele assuma o governo municipal.
E a tática para isso seria a cassação, tendo como base uma possível oneração da folha de pagamento feita pelo prefeito Frabizio, além de acusarem ele de desvio de verbas. Segundo moradores da cidade, até mesmo o pai do prefeito quer ver o filho fora do poder, incentivando as investidas do Dr. Rodrigues.
Os vices que apareceram
josé sarney
Na história do país, os vices nem sempre ficaram à sombra do titular. Que o diga o primeiro presidente da era democrática brasileira. José Sarney era o vice de Tancredo Neves nas eleições indiretas de 1984. A dupla venceu, mas o presidente de direito nunca pôde assumir, pois caiu doente e faleceu pouco depois. Sarney governou o país de 1985 a 1990.
Na sucessão do maranhense, veio Fernando Collor de Melo, eleito pelo povo e escolhido como o homem que iria melhorar a situação do Brasil. Dois anos após receber a faixa presidencial, Collor teve que sair do poder pela porta dos fundos, com seu mandato perdido por impeachment. Quem assumiu foi o vice dele, Itamar Franco, que completou o mandato e ainda lançou um dos planos que deu novo aspecto ao Brasil (o Plano Real), que equiparou a moeda brasileira com as mais importantes do mundo.
Em 2002, Luís Inácio Lula da Silva, com um projeto de coalizão de partidos, abriu espaço a todos e escolheu um vice com perfil bem diferente do dele. Durante o primeiro mandato, José Alencar se mostrou ponderado, mas, depois da renovação do mandato, reclamou sobre estar à sombra e se tornou um vice falador, de língua solta.
Bem antes disso, em 1954 (pré-Regime Militar), o vice-presidente Café Filho rompeu com Getúlio Vargas durante a principal crise da época, provocado pelo crime da Rua Tonelero. Com o suicídio do presidente Getúlio, Café assumiu o governo, ficando até novembro de 1955. Em 1961, a crise veio pela renúncia de Jânio Quadros. João Goulart, o Jango, assumiu, mas, em março de 1964, foi derrubado pelo Golpe de Estado. Nos dois casos, o vice-presidente em questão tinha posições contrárias ao presidente.
No Maranhão, Roseana Sarney foi eleita para dois mandatos de governadora, entre 1994 e 2002, sempre tendo como vice, José Reinaldo Tavares. No último ano, saiu do cargo para concorrer à presidência, mas desistiu e concorreu ao Senado. Deixou Zé Reinaldo completar o mandato em 2002 e lançou o mesmo como candidato do grupo naquele mesmo ano. Na segunda metade do mandato, aquele que sempre fora visto como o ‘eterno vice’ de Roseana, abandonou o grupo político que dominou o Maranhão por anos e iniciou uma revolução política no Estado, que culminou com a vitória de Jackson Lago (PDT).
Jackson sempre foi considerado muito bom com os vices que teve. Apenas em uma situação, a relação não terminou bem: foi com Domingos Dutra, durante a gestão de 1989 a 1992. Nos mandatos seguintes, Jackson teve como vice Tadeu Palácio, o qual deixou cumprir o restante do mandato e ainda ajudou na reeleição em 2004.
Whashigton Luís não tirou proveito como vice-governador no último mandato de Roseana Sarney (2010-2014), já que ela não confiaria muito nele. Porém, o petista foi agraciado com uma vaga no Tribunal de Contas do Estado, onde, hoje, é conselheiro.
Opinião de especialista
“Apesar de não ser central, a figura do ‘vice’ é fundamental na composição das alianças político-partidárias. O vice trabalha de forma mais significativa nos bastidores, na costura de alianças, exercendo as funções próximas da articulação política, visando viabilizar a eleição de sua chapa. Nesse sentido, a atuação do vice distancia-se sensivelmente dos holofotes midiáticos, o que lhe permite, de certo modo, ter maior liberdade de ação dentro do jogo político nos espaços não preenchidos pelo titular.
Com esse poder, o vice pode então aguardar pelo imponderável (falecimento do titular, afastamento do cargo por doença, etc.). É nesse espaço que ele pode aumentar sua zona de influência junto à gestão da qual participa e, assim, tentar alçar vôos mais altos, competindo politicamente com o titular.
O caso mais recente do vice-presidente da República, Michel Temer, presidente nacional do PMDB, é emblemático, pois mostra que as dinâmicas do jogo político podem se tornar extremamente conflituosas em contextos de profundas turbulências. Nisso, a força política adquirida pelo vice surge e cria espaços para caminhos próprios, independentes da base aliada.
Não é, portanto, de causar espanto, que o vice cobice a cadeira do titular, uma vez que ele entende que sua participação nas instâncias decisórias passa, inevitavelmente, por um diálogo com os demais aliados. Quando isso não ocorre e os acessos aos espaços de tomadas de decisão são bloqueados, tornando-o numa espécie de “vice decorativo”, a tendência é que sua resposta a tal situação seja de intensificação das cobranças por mais prestígio.
Portanto, dentre as habilidades que o titular do cargo deve possuir no manejo do trabalho político, uma que não pode ser negligenciada é a do diálogo constante e permanente com o seu vice e as forças que ele arregimenta em torno de si. Isso evita possíveis dissidências motivadas por alegações particulares e minimiza os efeitos nocivos de movimentações conspiratórias".
Hugo Freitas de Melo, professor de Sociologia da Universidade Federal do Maranhão (UFMA)
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