Há exatos 42 anos irrompia, num dos momentos mais marcantes da história recente do Brasil, o famigerado AI-5, um dispositivo jurídico-político que na prática significou o recrudescimento da repressão no país e a plenitude de poderes de exceção que levaram ao aumento da violência da Ditadura Militar (1964-1985).
O Ato Institucional Nº 05, gestado em 13 de dezembro de 1968, perdurou até o ano de 1978. Através dele, os generais no poder talharam para si a chamada “linha dura” do regime, que consistia no fim das liberdades individuais, no fechamento de partidos políticos, na cassação de mandatos, no exílio de incontáveis figuras civis (entre jornalistas, advogados, artistas, políticos, etc.), na perseguição aos religiosos considerados “subversivos” e na prisão, tortura e morte de muitos daqueles contrários ao regime.
Instituído ainda no governo do general Costa e Silva, foi durante o mandato presidencial do general Emilio Garrastazu Médici que seus ditames textuais suscitaram com mais vigor a repressão e a intolerância contra todos aqueles que colocassem em risco a “Segurança Nacional” ou que representassem uma ameaça à ordem vigente estabelecida pelos militares através da força das armas a partir do Golpe de 1964, que depôs a ordem democrática e tomou de assalto as rédeas políticas do Estado brasileiro.
Mesmo diante deste passado ainda tão recente, as chagas da ditadura militar são perceptíveis em diversos momentos no cenário político atual do país, particularmente em alguns estados da federação, onde as velhas estruturas ainda ditam as suas regras e se utilizam do mesmo molde violento que regeu o governo dos militares.
Os incidentes ocorridos no auditório do Sindicato dos Bancários do Maranhão, que começaram com vaias e terminaram com depredação e arremesso de cadeiras, foram as formas encontradas por supostos "estudantes" para silenciar e amedrontar os que assistiam ao evento. Informações veiculadas à época, principalmente pela mídia impressa, apontaram indícios que vinculariam os agitadores aos “defensores” da oligarquia Sarney, suspeitos de terem financiado as ações de violência e vandalismo.
Há pouco mais de um ano, por exemplo, um episódio ocorrido em São Luís deixou claro que a violência é um recurso bastante utilizado pelos poderosos quando as palavras e os argumentos são concebidos como verdadeiras "armas", que dilaceram como lâminas afiadas os corações e mentes de um povo ainda em insipiente processo de libertação dos grilhões invisíveis que os escravizam intelectualmente.
A noite da quarta-feira do dia 04 de novembro de 2009, data em que se realizou o lançamento do livro “Honoráveis Bandidos – Um retrato do Brasil na era Sarney”, do jornalista Palmério Dória, foi marcada por incidentes que ameaçaram seriamente a liberdade de expressão e que remontaram ao período de chumbo de nossa história, causando preocupação a todos quanto às (velhas e perigosas) formas de se fazer política em nosso Estado.
Tais ações representaram uma tentativa de silenciar a voz daqueles que bradam por um país mais justo e fraterno, mais livre e verdadeiramente democrático, à medida que o citado livro surgia no cenário político maranhense como um combustível a mais na luta contra as velhas estruturas, analisando e denunciando os desmandos ocorridos por estas paragens.
Em outras palavras, a truculência dos "manifestantes" pró-Sarney significou uma temerosa ameaça às liberdades constitucionais, principalmente à liberdade de expressão, pelas quais inúmeras lutas foram travadas e sangue derramado para que pudéssemos usufruí-las em sua plenitude. Isso demonstra o grau de analfabetismo político da juventude no Maranhão, que se submete às benesses promovidas pelos oligarcas à revelia de uma postura ética e crítico-reflexiva.
Pior, sinaliza para o retorno de um simbolismo histórico que remonta às atividades partidárias de homens como Adolf Hitler, Benito Mussolini e Josef Stálin, figuras públicas que suplantaram o debate político pela violência e coerção através da força.
Claramente, os eventos ocorridos naquela fatídica noite de quarta-feira denunciaram que estamos vivenciando a ameaça constante de sermos silenciados pela intolerância, pelo desrespeito às liberdades democráticas, pelo monopólio do poder político, pela força bruta dos donos do poder, em suma, pela oligarquia que deseja a manutenção de sua hegemonia através da cooptação corrupta de mentes e corações dos jovens despolitizados e mercenários do Maranhão.
Esta sensação de ameaça às liberdades garantidas pela Carta Magna não pode se sustentar. Eventos como este devem ser extirpados da vida política regional. Para isso, é necessário que haja um fomento maior na questão de conscientização política da juventude maranhense, há muito alijada do processo político em nosso Estado , concebida apenas como mera massa de manobra pelos velhos caciques.
Uma nova cultura política no Maranhão, portanto, é condição sine qua non para despertar nos jovens e adultos de nosso Estado a consciência de que estamos sendo obliterados constantemente em nossa liberdade de expressão. A tentativa de impedir o lançamento do livro “Honoráveis Bandidos” e o boicote feito à época junto às editoras proibindo a sua venda, hoje encontrado em diversos pontos de comercialização, são as provas materiais de que não são brandas as forças que teimam em tomar de assalto nossa voz, apedrejando o caminho que abre espaço para nossa vez.
Para tanto, contudo, urge a necessidade de se promover um debate mais arguto e eficaz sobre as liberdades democráticas, o direito à informação e o dever de todo cidadão de defender nossa Constituição, tantas vezes desrespeitada e colocada à margem das ações de nossos governantes.
Negligenciá-la, portanto, é caminhar para trás. Não obedecer a seus princípios norteadores é a constatação de que voam longe os dias em que a diferença abissal entre a instituição das normas reguladoras e a sua práxis social efetiva será atenuada. Resistir, contudo, é preciso.
Neste dia em que o AI-5 completa mais um aniversário e que vivemos o momento em que muitos estudos são feitos em todo o país sobre os anos de chumbo da ditadura militar, devemos relembrar eventos como os ocorridos no lançamento do livro de Palmério Dória para mostrar aos quatro cantos do mundo que a luta pela garantia dos nossos direitos é algo perene e constante. Afinal, a liberdade é a única bandeira pela qual vale a pena edificar trincheiras.
Caro Hugo:
ResponderExcluirEm Imperatriz a coisa ainda foi pior no dia do lançamento deste livro-reportagem. Veja só:
http://josuemoura.blogspot.com/2010/08/baderneiros-de-sarney-e-roseana-levam.html
Bem lembrado, Carlos.
ResponderExcluirMuito bom você ter enviado este comentário, pois assim os demais leitores terão uma visão holística sobre o assunto, que é sério e deve ser publicado para que todos tenham a dimensão da força bruta da velha estrutura que ainda assola nosso Estado, de norte a sul.
Valeu mesmo pela lembrança e pela fonte.
Abraços fraternos
Adoro esse livro! Seu blog está cada vez melhor parceiro Abraços.
ResponderExcluirMuito obrigado, fera! Fico sinceramente feliz e honrado com tais elogios. É a constatação de que os textos aqui publicados estão atingindo as pessoas certas: lúcidas e conscientes.
ResponderExcluirAbraços fraternos.
Hugo Freitas