Poderes Executivo e Judiciário divergem sobre a situação da segurança pública estadual
Por Hugo Freitas
Antes, "aliados de todas as
horas", reflexo das relações de reciprocidade tecidas e mantidas entre membros do grupo Sarney e as elites locais, balizadas pela Constituição Federal que prevê a nomeação dos magistrados nas Cortes regionais pelos respectivos governos estaduais, o Judiciário e o Executivo maranhenses parecem estar com seus laços paritais estremecidos depois das críticas feitas pela governadora Roseana Sarney
(PMDB) aos togados estaduais.
Em duas oportunidades, tanto em
entrevista (confira aqui), quanto no relatório encaminhado pelo Governo do
Estado à Procuradoria Geral da República, Roseana atribuiu a responsabilidade
pelo caos no sistema prisional do Maranhão ao Judiciário maranhense.
Na concepção da governadora, a
morosidade e omissão da Justiça em julgar ações de condenação é uma das causas
da superlotação no Complexo Penitenciário de Pedrinhas, cuja situação calamitosa alcançou patamares
de destaque internacional após a onda de violência que explodiu nos últimos
meses entre os detentos que disputam o controle do tráfico de drogas de dentro
do presídio (confira aqui).
Contrário ao pensamento da chefe do
Executivo estadual, o presidente da Associação dos Magistrados do Maranhão
(AMMA), juiz Gervásio Santos, contestou o referido relatório e disse que o
Governo deveria reconhecer a existência da crise para tentar combatê-la.
“A primeira e mais urgente ação do
Governo do Estado para debelar a crise na segurança do Maranhão seria
reconhecer que ela existe e deixar de tentar transferir a responsabilidade ao
Judiciário, ao CNJ e ao Governo Federal”, afirmou o magistrado, afinando o
discurso ao da presidente do Tribunal de Justiça estadual, Cleonice Freire, que
foi categórica ao dizer que "os problemas no sistema carcerário independem
do Poder Judiciário" (leia aqui).
Defensor da "política do encarceramento", Gervásio Santos aponta que uma das
maiores questões a serem solucionadas é a falta de vagas nas prisões. Segundo ele, até
dezembro de 2013, existiam no sistema carcerário maranhense 5.384 presos, dos
quais 1.985 estão recolhidos no Complexo Penitenciário de Pedrinhas.
Números do
último levantamento feito pela Unidade de Monitoramento, Acompanhamento e
Aperfeiçoamento do Sistema Carcerário do Tribunal de Justiça apontam que
o déficit no sistema prisional do Maranhão supera a marca das duas mil vagas.
Dos 5.384 presos, 1.563 estão distribuídos em delegacias de polícia no interior
do Estado.
Segundo dados da Secretaria de Justiça e Administração Penitenciária (Sejap), em todo o Maranhão há unidades prisionais apenas em São Luís e nos municípios de Caxias, Imperatriz, Açailândia, Chapadinha, Pedreiras e Timon, o que evidencia a falta de infraestrutura no setor.
MANDADOS NÃO CUMPRIDOS
Na concepção do presidente da AMMA, há
vários fatores no relatório do Executivo que mereciam ser avaliados antes de
atribuir a culpa ao Judiciário. Um deles é que segundo o Banco Nacional de
Mandados de Prisão mantido pelo CNJ, existem 5.539 mandados expedidos pela
justiça maranhense sem cumprimento, o que desmente o mito de que a polícia
prende e a justiça solta.
Conforme Gervásio, uma das causas para
ausência de cumprimento desses mandados é o baixo efetivo da Polícia Militar. Dados divulgados pela Revista Exame (leia aqui) apontam o Maranhão com um efetivo de apenas 7.443 policiais militares, o que dá uma média de um policial para cada 882
habitantes, quando a média nacional é de um PM para 472 habitantes.
PRESOS PROVISÓRIOS
Outro ponto destacado pelo Governo
do Estado no relatório entregue à Procuradoria da República diz respeito ao grande número de presos provisórios no sistema
prisional. Segundo Gervásio, a taxa é de 57%, do total dos 5.384 presos, porém,
ele esclarece que presos provisórios são todos os que estão recolhidos ao
sistema sem sentença transitada em julgado, ou seja, foram condenados, mas
ainda cabe recurso, houve a condenação, mas a guia ainda não foi expedida, ou,
ainda, que estão sob prisão de natureza cautelar.
O magistrado não afasta a possibilidade
que nessa massa carcerária possa, eventualmente, haver presos recolhidos com
prazo vencido, mas ainda que esses fossem excluídos, isto não solucionaria o
problema do sistema penitenciário maranhense.
Segundo ele, contribui para esse tipo
de ocorrência, sobretudo, a falta de apresentação dos presos nas audiências.
“Os fóruns em todo o estado registram o adiamento de dezenas de audiências por
esse motivo”.
Na concepção de Gervásio, dois fatores
são preponderantes para isso: ausência de defensores públicos
e quase 40 unidades judiciárias vagas em todo o estado. "Portanto, não se trata
de mera lentidão da justiça, como declarou a governadora", declarou o juiz em defesa do Judiciário estadual.
SOLUÇÕES
Para Gervásio, a superação do problema
exige medidas de médio e longo prazo, dentre elas, a construção de novas
unidades penitenciárias no interior do estado para que presos sejam mantidos no
seu ambiente, evitando contatos com as facções criminosas, e a construção de
presídios de segurança máxima onde possam ser mantidos os presos de alta
periculosidade.
O magistrado cita, ainda, a necessidade de
instituição de políticas públicas efetivas voltadas à ressocialização, além da
reestruturação de todo o sistema penitenciário, com a dispensa de terceirizados
e a contratação de agentes preparados para o exercício da função.
Por fim, o juiz Gervásio Santos sugere
três medidas de imediato para manter sob controle a segurança pública:
1) a transferência dos líderes das
facções criminosas para presídios federais;
2) reforço do policiamento urbano para
aplacar a ira dos criminosos que estão soltos e seguem as ordens dos líderes
presos e;
3) esforço concentrado do Executivo,
Judiciário, Defensoria Pública, Ministério Público e entidades da sociedade
civil organizada que tratam da questão carcerária.
As declarações do juiz Gervásio são um dos raros fachos de luz que incidem sobre a grave crise que assola os presídios maranhenses e assusta a população, em face de tantos usos políticos que são feitos das vítimas inocentes deste descalabro, onde a busca por "culpados" é maior do que o desejo de enfrentar e superar os problemas.
As declarações do juiz Gervásio são um dos raros fachos de luz que incidem sobre a grave crise que assola os presídios maranhenses e assusta a população, em face de tantos usos políticos que são feitos das vítimas inocentes deste descalabro, onde a busca por "culpados" é maior do que o desejo de enfrentar e superar os problemas.
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